VIII MOSTRA DE POESIA CONTEMPORÂNEA DA APPERJ- 2025
ESTOU DE PÉ
Eu posso ser excluída dos registros,
ser apagada dos livros e da memória dos que nunca me conheceram.
Posso ser empurrada para abismos e penhascos,
ser afogada nos lamaçais da mentira e da traição,
ser incinerada, como um arquivo desnecessário,
que,
como a onda mais revolta,
me erguerei das profundezas e mostrarei minha força.
Sei que muitos ficam perturbados comigo,
preferem a distância,
mas não me dão paz,
que meus tesouros secretos
atraem e repelem na mesma intensidade.
E, como as palmeiras nas tempestades,
as velas dos barcos depois das tormentas,
a flor que insiste em brotar no jardim de cimento,
eu me erguerei em silêncio.
Eu estou de pé.
Posso até estar cabisbaixa e triste,
aglutinar poças de lágrimas,
sofrer noites de insônia e solidão,
mas, como um braço certeiro em meio à multidão,
como a roupa no varal durante a ventania,
como o amor supostamente adormecido,
eu me erguerei sem titubear.
E estarei de pé.
Eu estou de pé.
Tenho medo? Alguma fraqueza? Coleciono feridas?
Decerto que sim.
Tenho uma alma peregrina e intensa,
e um coração que abriga as minhas riquezas,
essas que tanto provocam a cobiça e o assombro.
Podem me esfolar em versos, me dilacerar com a indiferença,
podem me aniquilar com ódio, tentar me calar a voz,
que, mesmo com todos os lances contrários,
meu sangue ferve, meu sexo pulsa, minhas pernas são firmes,
e eu estou de pé.
Eu estou de pé.
Com o ventre em chamas, a boca sedenta,
os pés descalços, bailando na fogueira e gargalhando.
Porque já percorri todas as trilhas, escalei todas as montanhas,
montei em todos os arco-íris e cavalguei em pelo,
contato íntimo, dona das minhas vontades.
De todos os julgamentos,
todas as ofensas proferidas por bocas incomodadas com minha liberdade,
todos os limites e punições impostos pela sociedade dominante,
eu estou de pé.
Das dores das mulheres que vieram antes de mim,
das lutas travadas contra moinhos que moíam suas vidas,
eu me ergo.
Sou a que perpetuará a existência,
a rocha que estará lá, apesar das ondas e dos anos,
segura e firme em suas crenças,
apoio para as que virão,
sem carregar o pânico e a desventura.
Eu estou de pé, como quem enxerga o fim da treva.
Eu estou de pé, como quem resiste aos açoites das águas.
Estou de pé, como quem soletra a palavra fincada na pele.
Estou de pé, empunhando a sentença da mulher que vence,
da mulher que escolhe,
da mulher que dança, da mulher que canta,
da mulher que cai e se levanta e vai.
E, por tudo isso, eu estou de pé.
Por minha filha, eu estou de pé.
Por minha neta, eu estou de pé.
Por todas e tantas mais, eu estou de pé.
Eu estou de pé!
De pé!
Sempre de pé!
LÍLIAN MAIAL é carioca, médica, escritora e poeta. Publicou 15 livros, sendo 7 de poesia, 6 infantis, 1 de minicontos e 1 técnico de Perícia Médica. Ocupa a cadeira de nº12, da Academia Internacional Poetrix (AIP). Filiada à REBRA, à APPERJ e participa do coletivo feminista MULHERIO DAS LETRAS, tendo organizado o VIº Encontro Nacional, no Rio de Janeiro, em outubro de 2023. Ativista cultural, idealizadora e anfitriã do Vem pra Cá Sarau, e organizadora e revisora da Antologia Vem pra Cá - Conexões, lançada na Bienal do Livro RJ 2025. www.lilianmaial.com - facebook.com/lilian.maial @lilian.maial
ser apagada dos livros e da memória dos que nunca me conheceram.
Posso ser empurrada para abismos e penhascos,
ser afogada nos lamaçais da mentira e da traição,
ser incinerada, como um arquivo desnecessário,
que,
como a onda mais revolta,
me erguerei das profundezas e mostrarei minha força.
Sei que muitos ficam perturbados comigo,
preferem a distância,
mas não me dão paz,
que meus tesouros secretos
atraem e repelem na mesma intensidade.
E, como as palmeiras nas tempestades,
as velas dos barcos depois das tormentas,
a flor que insiste em brotar no jardim de cimento,
eu me erguerei em silêncio.
Eu estou de pé.
Posso até estar cabisbaixa e triste,
aglutinar poças de lágrimas,
sofrer noites de insônia e solidão,
mas, como um braço certeiro em meio à multidão,
como a roupa no varal durante a ventania,
como o amor supostamente adormecido,
eu me erguerei sem titubear.
E estarei de pé.
Eu estou de pé.
Tenho medo? Alguma fraqueza? Coleciono feridas?
Decerto que sim.
Tenho uma alma peregrina e intensa,
e um coração que abriga as minhas riquezas,
essas que tanto provocam a cobiça e o assombro.
Podem me esfolar em versos, me dilacerar com a indiferença,
podem me aniquilar com ódio, tentar me calar a voz,
que, mesmo com todos os lances contrários,
meu sangue ferve, meu sexo pulsa, minhas pernas são firmes,
e eu estou de pé.
Eu estou de pé.
Com o ventre em chamas, a boca sedenta,
os pés descalços, bailando na fogueira e gargalhando.
Porque já percorri todas as trilhas, escalei todas as montanhas,
montei em todos os arco-íris e cavalguei em pelo,
contato íntimo, dona das minhas vontades.
De todos os julgamentos,
todas as ofensas proferidas por bocas incomodadas com minha liberdade,
todos os limites e punições impostos pela sociedade dominante,
eu estou de pé.
Das dores das mulheres que vieram antes de mim,
das lutas travadas contra moinhos que moíam suas vidas,
eu me ergo.
Sou a que perpetuará a existência,
a rocha que estará lá, apesar das ondas e dos anos,
segura e firme em suas crenças,
apoio para as que virão,
sem carregar o pânico e a desventura.
Eu estou de pé, como quem enxerga o fim da treva.
Eu estou de pé, como quem resiste aos açoites das águas.
Estou de pé, como quem soletra a palavra fincada na pele.
Estou de pé, empunhando a sentença da mulher que vence,
da mulher que escolhe,
da mulher que dança, da mulher que canta,
da mulher que cai e se levanta e vai.
E, por tudo isso, eu estou de pé.
Por minha filha, eu estou de pé.
Por minha neta, eu estou de pé.
Por todas e tantas mais, eu estou de pé.
Eu estou de pé!
De pé!
Sempre de pé!

De pé, sempre!
ResponderExcluirRenato Moura: 🌹❤️🙏
ResponderExcluirParabéns, querida Lílian!
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